16 de setembro de 2025
BOM DIA, VERÔNICA



 

    Tal como seu título, Bom dia, Verônica começa de forma bem prosaica e corriqueira: nossa personagem-título é uma paulistana, concursada como escrivã, esposa, mãe relapsa de suas crianças, vaidosa, leonina, enfim, tudo bem normal, só que não! Verônica não trabalha de fato como escrivã, mas sim como secretária do delegado da Delegacia de Homicídios, havendo um segredo por trás disso... Em seu local de trabalho, ela se depara com todo tipo de situação escabrosa, como o caso de Marta Campos...
    Ao chegar ao escritório para mais um dia de trabalho, Verônica vê uma mulher sair desesperada do escritório de seu chefe. A moça tenta ajudá-la, mas já é tarde demais, a outra se joga da janela, tirando a própria vida, suas últimas palavras: "talvez agora ele possa me amar". Intrigada, nossa protagonista descobre que a suicida fora à delegacia a fim de prestar queixa contra um golpista que conheceu on-line, depois a dopou, roubou e ainda lhe transmitiu uma ist bem bizarra. O delegado faz galhofa da pobre e iludida mulher. Não lhe restando mais nada, ela salta. Verônica, entretanto, não a deixa à deriva e jura para si mesma que encontrará o pilantra custe o que custar. 
    A narrativa de Bom dia, Verônica sofre então um desvio. Passamos a acompanhar, através de um narrador em 3ª pessoa, uma mulher cujo nome é Janete, mas bem poderia ser Amélia, afinal, ela representa muito bem o estereótipo "bela, recatada e do lar" adicionando as suas predicações apenas um marido psicopata, viciado em matar mulheres pobres, e ela sendo sua cúmplice forçadamente, vivendo no ciclo vicioso de um relacionamento abusivo, criminoso e muito, muito perigoso. 
    Ao ver Verônica na televisão falando sobre Marta Campos, Janete sente-se encorajada a quebrar o ciclo hediondo e tenta contato com a "policial". A partir daí, ela travará uma batalha interna intensa e desleal para tentar livrar-se de Brandão, seu marido psicopata. 
Desse ponto em diante, a narrativa de Bom dia, Verônica se alterna entre capítulo de Verônica e de Janete; nos da primeira, vemos suas tentativas desesperadas de encontrar o golpista, descobrindo seus hábitos macabros e o significado das últimas palavras de Marta; nos da segunda, assistimos sua rotina, ainda mais macabra nos dias escolhidos por Brandão para torturar e matar mulheres. 
    Durante a leitura de Bom dia, Verônica foi quase impossível não associar a personagem-título à Fátima da série Califado (a qual pretendo falar aqui em novembro), ambas têm o mesmo modo de agir: ajudar a vítima colocando seus interesses em primeiro lugar, não parando para pensar o quão perigosa uma investigação "extraoficial" pode ser para quem dorme com o inimigo, ademais, ambas enganam as vítimas dizendo terem o apoio da polícia, sendo a realidade bem diferente disso. 
    Bom dia, Verônica foi uma grata surpresa. Há alguns pontos difusos na trama? Sim. Os autores, entretanto, conseguiram criar uma narrativa tão densa e eletrizante que os "defeitos" não estragam a experiência de leitura. 
    Verônica e Janete são ambas personagens ambíguas, longe de serem  as "mocinhas" de um clichê policial, elas são mulheres, em suma, reprimidas de alguma forma, tentando se libertar, e com muito medo de falhar miseravelmente...
    O desfecho de Bom dia, Verônica é agridoce, sendo coerente com tudo o que nos foi apresentado sobre essas personagens, tornando o enredo ainda mais interessante. Se você gosta de romances policiais, suspense e protagonismo feminino, leia esse livro, certifique-se, contudo, de não deixá-lo guardado em uma caixinha depois...

11 de setembro de 2025
A Missão de Senar

 Olá, pessoas! Samu aqui!



Hoje trago a resenha do segundo livro da trilogia Crônicas do Mundo Emerso, chamado A Missão de Senar. O livro anterior me surpreendeu bastante, contendo uma narrativa muito bem construída (inclusive você pode ler a resenha dele clicando aqui), e agora essa continuação tratou de manter o mesmo ritmo. Adorei cada capítulo!


Enquanto no primeiro livro o foco estava inteiramente na personagem Nihal e seu treinamento para se tornar uma cavaleira de dragão, este segundo volume já começa a dividir a narrativa em dois núcleos. Ou seja, em alguns capítulos continuamos acompanhando Nihal, afinal, ela é a protagonista da trilogia, mas além dela também temos capítulos cujo foco está na viagem de Senar em busca do lendário Mundo Submerso.


Senar é um jovem mago que no livro anterior havia se tornado o representante da Terra do Vento no conselho de magos do Mundo Emerso (uma espécie de ONU que visa manter a paz das oito terras). Contudo, no momento da narrativa já faz 40 anos que um mago do mal conhecido como Tirano tem dominado as terras uma a uma, de modo que o Mundo Emerso está em guerra por todo esse tempo.





Depois que o exército do Tirano finalmente dominou a Terra do Vento (evento que ocorre no livro 1 da trilogia), os governantes das poucas terras que ainda são livres já não sabem mais o que fazer e estão sem recursos para virar a guerra a seu favor. É nesse contexto que Senar tem a ideia de buscar a ajuda do lendário Mundo Submerso, um reino secreto que existe nas profundezas do oceano.


-- Fim do Spoiler --


Com isso, Senar se alia com um grupo de piratas (os mais loucos do rolê) e juntos partem para a Voragem, o local onde supostamente nosso herói encontrará a passagem para o Mundo Submerso, pretendendo pedir auxílio dos habitantes desse reino mítico na guerra contra o Tirano. Enquanto isso, Nihal continua seu treinamento e finalmente se torna cavaleira de dragão. Em suas primeiras batalhas como cavaleira, nossa protagonista vai conhecer um novo e poderoso inimigo: o gnomo Dola, um cavaleiro de dragão negro a serviço do Tirano.


Daí pra frente muitas reviravoltas e cenas emocionantes vão rolar. Batalhas muito bem descritas, conflitos psicológicos entre os personagens, provações, aventura, enfim… na minha opinião, um livro sem defeitos! Mentira, tem um defeito sim, a capa. Nossa, pense numa capa feia, meu Deus do céu! Não sei quem foi o capista desse trem, mas tanto o primeiro quanto o segundo livro têm capas terríveis de causar revertério em qualquer leitor. Por isso estou usando as da versão original em italiano. Torço para que algum dia haja uma nova edição, em português, com capa melhorzinha. No mais, continuo super recomendando esta trilogia!



9 de setembro de 2025
AS BRUMAS DE AVALON - LIVRO 3

 O gamo-rei



    Existe um motivo para eu ter demorado nove anos para eu dar continuidade as leituras de O ciclo de Avalon: fiquei saturada do estilo narrativo de Marion Zimmer Bradley e de sua principal colaboradora, Diana L. Paxson. Contudo, O gamo-rei provou-se uma leitura interessante e muito prazerosa, algo realmente surpreendente após o desastre que é A grande rainha... (mas esse é o meu ranço da Guinevere falando). 
    Em O gamo-rei, a história começa alguns anos após o término do livro anterior: Morgause, agora viúva, governa o reino de Lot e cria o filho de Morgana como se fosse seu, e seu poder sobre o garoto é ameaçado quando Viviane o reivindica para Avalon. 
    Nesse mesmo período, Morgana vive na corte de Arthur e percebe como Guinevere o tem influenciado a, cada vez mais, abandonar a fé antiga, voltando-se para o cristianismo, o que a deixa exasperada e muito irritada com ambos. 
    O reino passa por um período de relativa paz, contudo, Guinevere é raptada, (por pura burrice dela, diga-se de passagem) torturada e salva apenas por Lancelote. Após esse ocorrido, eles se tornam verdadeiramente amantes, ou seja, consumam o negócio, e todos na corte sabem disso. Em contrapartida, Elaine, prima da rainha, também é apaixonada pelo cavaleiro do Lago, assim, para evitar vários problemas, Morgana intervém e cria um ardil para separar os amantes, unindo Elaine a seu amado. 
    Em O gamo-rei não há muita ação, no sentido de batalhas, mas o fato da narrativa seguir, principalmente, passos e pensamentos de Morgana torna a história muito interessante de se acompanhar! No final, Marion Zimmer Bradley traz um gancho perfeito para deixar o leitor com ainda mais vontade de ler o último volume da saga, pois o filho de Morgana e Arhtur é "da pá virada" e está com sangue nos olhos para destruir o pai, os cristãos e tudo o que estiver em seu caminho. 

2 de setembro de 2025
SEM CORAÇÃO

 


    Mais uma história deliciosamente narrada em 3ª pessoa! É muita alegria para uma leitora só! Até porque eu não esperava nada desse livro escrito por Marissa Meyer, e mesmo assim fui completamente arrebatada por Sem coração

    Sem coração já começa com uma premissa muito apreciada por mim, que adoro uma boa releitura de contos de fadas, ainda mais quando ela se propõe a narrar a vida pregressa de uma personagem, tal como Marissa Meyer faz aqui. Neste livro acompanhamos a trajetória de Catherine, uma jovem nobre do Reino de Copas que tem o sonho de se tornar empreendedora, abrindo sua própria confeitaria, mas seus pais têm outros planos para o futuro da filha. 
    Marissa Meyer esbanja criatividade e verossimilhança ao unir as três histórias mais famosas de Lewis Caroll em Sem coração, isso porque ela detalha bem a vida e as personagens meio insanas de Copas, vulgo País das Maravilhas, além de trazer, através do espelho, do Reino de Xadrez, o interesse amoroso de nossa protagonista e ainda acrescentar o jaguadarte para dar ainda mais tempero a essa narrativa. 
    É muito interessante e triste, ao mesmo tempo, acompanhar a vida de Catherine, pois a jovem é muito gente boa e seu sonho é genuíno e muito próximo da nossa realidade. Infelizmente, seus pais decidem que a querem casada com o rei de Copas e, para piorar a situação, o próprio também quer isso. Se esse dilema já não fosse dramático o suficiente, surge na vida de nossa futura vilã, Jert, o novo bobo da corte, um jovem enigmático e muito bonito que fará de tudo para ter o coração de nossa aspirante a confeiteira, talvez, não no bom sentido... Além de tudo isso, Marissa Meyer ainda traz a ameaça do jaguadarte que denuncia de forma sutil a completa incapacidade de rei de Copas de governar sozinho. 
    Sem coração foi uma das melhores releituras de contos de fadas que li até hoje. Personagens cativantes, enredo envolvente, narrador em 3ª pessoa, reviravoltas, final impactante, enfim, Marissa Meyer acertou muito aqui! Até porque ela nos faz ficar interessados em uma futura vilã e nós já sabemos que nada do que ela quer acontecerá, senão, ela não seria quem é em Alice no País das Maravilhas, logo, o desenvolvimento de Catherine é de suma importância para manter o leitor atento e das demais personagens também, e isso a autora faz muito bem tornando-as ambíguas desde o começo. 
    Um pequeno detalhe colocado por Marissa Meyer em seus agradecimentos fez todo o sentido para mim e tornou esse livro ainda mais instigante: essa narrativa foi inspirada em Wicked, de Gregory Maguire. É impossível não ver as semelhanças entre os estilos de narrar e isso é um elogio! Sem coração é um romance incrível, não tão incrível quando sua inspiração, mas chega bem perto! Se você gosta de young adults e está de saco cheio dos mesmos triângulos amorosos enfadonhos e protagonistas chatas, dê uma chance a esse livro, ele vai surpreender você! 

26 de agosto de 2025
A PRINCESA PROMETIDA


 

    Quando eu tinha uns dez ou doze anos, havia um filme que sempre passava na saudosa "Sessão da Tarde", o qual eu gostava muito, mas, por algum motivo desconhecido, nunca conseguia assisti-lo até o final. O nome dessa produção é A princesa prometida
    No dia 30 de dezembro de 2019, fui a feira do livro da Martins Fontes, lá na Paulista. Ao passar pelas diversas fileiras de livros qual não foi a minha surpresa ao deparar-me com A princesa prometida?! Não pensei duas vezes, levei o livro para casa, o tempo passou e finalmente realizei essa leitura, contudo, não estava preparada para o estilo de William Goldman e me surpreendi bastante. 
    Talvez você não se lembre; eu me lembro vividamente do início do filme A princesa prometida: toda aquela aura mágica e fantasia em volta da história de amor da bela Buttercup e do jovem Westley. No livro, ela também acontece, a magia e a fantasia também estão lá, entretanto, essa não é a única história que lemos. 
    Em A princesa prometida, William Goldman, nos traz duas narrativas igualmente fictícias com toques de realidade: a primeira, é da própria vida dele e de como tornou-se um roteirista premiado por causa da história de Buttercup, lida por seu pai quando ele era um menininho e estava acamado; a segunda, narra o romance A princesa prometida, apensas com as partes boas, visto que o livro completo de S. Morgenstern era uma sátira sobre a política do reino de Florin e sempre foi amplamente estudado por acadêmicos desse país...
    Agora, eu quero que você abra uma outra aba em seu navegador e pesquise "mapa mundi", clique em imagens e procure pelo nome de Florin. Achou alguma coisa? Pois é, Willian Goldman é um bom contador de histórias... Ele aborda essa sua "vida pessoal" de forma tão verossímil que um leitor menos atento, ou com pouco conhecimento em Geografia, poderia acreditar em tudo e ficar bem confuso ao saber, por exemplo, que Stephen King não é natural do Maine, mas sim de Florin. hahaha
    Muita loucura? Pois ainda nem chegamos ao enredo principal do livro... A princesa prometida nos apresenta a belíssima e bem obtusa Buttercup, filha de fazendeiros; e o belo e muito inteligente Westley, o praticamente escravo do lugar; Com o passar dos anos, a relação deles torna-se muito maior do que a mera dinâmica de patrão/empregado, sempre pontuada pela submissa resposta do rapaz: "Como quiser", a tudo o que a jovem lhe pede; e eles se apaixonam avassaladoramente. 
    O problema é que Westley decide viajar para conseguir dinheiro a fim de casar-se; Buttercup o aguarda ansiosa, contudo, poucos meses depois, uma carta funesta chega: o terrível pirata Roberts atacou o navio no qual Westley trabalhava e matou a todos. Ao saber disso, a jovem decide nunca mais amar e aceita o pedido de casamento por conveniência com o príncipe de Florin, um psicopata. 
    Pouco tempo antes do casamento, Buttercup é sequestrada por um trio bem estranho que quer matá-la em nome do reino vizinho a Florin, Guilder; o que pode ocasionar uma guerra entre eles. Para surpresa de todos, o próprio pirata Roberts se envolverá nessa disputa, pois ele quer vingar-se de Buttercup que, para ele, é uma mulher frívola e infiel. 
    Por ter apenas as partes "boas", em diversos momentos, William Goldman se intromete na narração e nos explica porque "cortou" determinadas partes, o que pensava delas etc. Basicamente, ele só deixou as cenas de ação, aventura e magia no livro, o que nós, leitores, agradecemos muito. Infelizmente, as intromissões são um pouco enfadonhas em alguns pontos e, sinceramente, eu não estava interessada na vida e opiniões dele, eu só queria a ação mesmo, confesso. 
    Há, contudo, algo muito interessante em A princesa prometida, do ponto de vista da enunciação, segundo Benveniste, pois fica bem clara ao longo da leitura, a diferença entre o autor "William Goldman" real, que ganhou dois oscars de melhor roteiro original, o enunciador "William Goldman" que nos conta sua "história" e modifica algumas partes de A princesa prometida e o narrador. Sabendo disso, a leitura torna-se mais rica e interessante. 
    Com certeza, essa obra dividiu bastante minha opinião, não sei bem se gostei desse estilo narrativo, até porque demorei cerca de quatro meses para concluir a leitura, logo, não consigo recomendar A princesa prometida para alguém que nunca ouviu falar dessa história, talvez a experiência seja confusa e maçante. 
    Sobre a edição: a editora Intrínseca está de parabéns! O livro produzido em capa dura, com uma arte linda que remete ao filme, além de ter um mapa, páginas amareladas, uma ótima revisão gramatical e alguns textos extras é realmente maravilhoso. É uma edição perfeita para colecionadores. 

19 de agosto de 2025
A OUTRA FACE

 História de uma garota afegã


     Há décadas as atenções mundiais têm se aglutinado em torno dos conflitos no Oriente Médio e em alguns países mulçumanos da Ásia, como é o caso do Afeganistão, contudo, o que jornais e revistas muitas vezes não divulgam é a vida cotidiana das pessoas comuns, sendo as mulheres aquelas que mais sofrem. A outra face, história de uma garota afegã, da autora Deborah Ellis, nos mostra de forma delicada e sensível a dura vida da população afegã durante o regime Talibã. 
    Através de um narrador em 3ª pessoa, acompanhamos a vida de Parvana e sua família. Pouco tempo após a tomada da capital Cabul, seus pais perderam os empregos, as mulheres foram obrigadas a ficarem presas em casa, escolas femininas foram fechadas e qualquer pessoa do sexo feminino só poderia sair de casa estando completamente coberta, as adultas, de burca, e sempre acompanhadas por um homem, ou rapaz, JAMAIS sozinhas. 
    Todos vivem em estado de extrema tensão, perderam seu padrão de vida bom de outrora, sua liberdade e um filho, morto por uma mina terrestre. Porém, pelo menos o pai de Parvana consegue um trabalho lendo e escrevendo cartas, logo, fome eles não passam. Inesperadamente, em uma noite agradável e tranquila, a casa da família é invadida por membros do Talibã, que levam seu pai preso e ainda espancam sua mãe. desesperadas, elas não sabem o que fazer: há cinco bocas para se alimentar e nenhum homem para ganhar dinheiro. Quando tudo parece sucumbir, uma amiga da família define um plano: Parvana se tornará um menino, podendo assim trabalhar e sustentar a família. Ademais, sua mãe e a amiga iniciam a produção de uma revista a fim de denunciar toda a opressão e barbárie causadas pelo Talibã. 
    Assim, vemos de que maneira nossa protagonista se arranjará trabalhando e enganando o regime, sempre de olhos bem abertos e alerta diante de qualquer ameaça. Além disso, outras situações nos são mostradas, tais como punições brutais, usadas como "espetáculo", a terrível sombra da venda de meninas muito jovens com o objetivo de se casarem e com o dinheiro sustentarem suas famílias; as prisões injustas, os desaparecimentos...
    Tudo é muito realista e não poderia deixar de ser, já que A outra face, história de uma garota afegã é fruto de um minucioso trabalho da ativista Deborah Ellis, ao reunir diversos relatos contados por mulheres afegã. A vida de Paravana , de sua família e amigos, infelizmente, não é mera ficção, mas sim uma colcha de retalhos de fatos cotidianos de muitas pessoas que perderam tudo, menos a esperança de um Afeganistão justo e pacífico para todos novamente. 

12 de agosto de 2025
O QUINZE

Um livro de perdas...



 

    Sem sombra de dúvidas, o livro O quinze, de Rachel de Queiroz é repleto de perdas para suas personagens, mas de muitos ganhos para a autora, que foi longamente elogiada por grandes nomes da época após sua publicação. 
    O quinze tem esse título por causa da seca que abalou o Nordeste brasileiro no ano de 1915. As população da região se viu arrasada pelas mortes dos animais, a falta de comida e de água e pelo desemprego. Rachel de Queiroz nos apresenta três núcleos de personagens que se entrelaçam, mas têm desenvolvimentos bem diferentes. 
    Primeiro, conhecemos Conceição, uma jovem e progressista professora que sonha ser mãe, contudo, não vê o casamento com bons olhos... ela é o interesse amoroso de seu primo, Vicente, um jovem rústico e trabalhador que preferiu dedicar sua vida à fazenda dos pais, do que estudar e viver na capital como a prima. Por fim, acompanhamos a dura trajetória do vaqueiro Chico Bento e de sua família. Ao contrário dos outros dois, estes não têm condições financeiras de sobreviver à seca, por isso decidem partir, contudo, em seu caminho eles encontram tanta tristeza e miséria que terão muito mais arrependimentos do que esperança. 
    Em suma, O quinze é uma narrativa bem característica do Regionalismo brasileiro, pois traz os dramas das pessoas pobres de forma bem realista, crítica e objetiva. É um romance de denúncia, sem ser panfletário. Tal como Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz também possui um estilo conciso, duro e cortante. Nenhuma palavra é usada como mera decoração, todas as frases são carregadas de sentido e suas personagens demonstram bem os tipos sociais que marcaram o início do século XX no país. 
    Por causa da variação linguística específica da década de 1930, entretanto, um leitor menos preparado pode ter um pouco de dificuldade de realizar a leitura de O quinze, pois muitas palavras caíram em desuso e ter um dicionário à mão talvez seja necessário. 
    Chegamos à conclusão de que O quinze, de Rachel de Queiroz é uma narrativa curta e simples, porém, cheia de reflexões sobre a dura sorte das pessoas pobres e de como somos completamente marginalizados e vistos como meros joguetes nas mãos de quem tem poder.