Este é considerado um romance "urbano", no entanto, Memórias de um Sargento de Milícias, difere muito dos ideais românticos da época, por esse motivo, tal como acontece com As pupilas do Senhor Reitor, em Portugal, costumamos dizer que o livro de Manuel Antônio de Almeida é um romance pré-realista, pois mistura a superficialidade e as personagens arquétipas da prosa romântica, com o humor ácido, sarcástico e crítico da prosa realista. Sabendo disso, vamos à estória!
A narrativa acontece no período em que D João VI reinou no Brasil, entre 1808 e 1821, entretanto, as publicações dos capítulos em folhetim aconteceram durante o Segundo Reinado, tendo D. Pedro II como Imperador do Brasil.
O livro começa com a frase "Era no tempo do rei" que já nos remete a tradição oral e ao ato de se contar uma estória. Somos apresentados primeiramente aos portugueses Leonardo Pataca, homem caráter dúbio, bebe muito, é preguiçoso e sua grande perdição são as mulheres e Maria - da - Hortaliça que vieram juntos ao Brasil a fim de melhorar de vida. O "romance" dos dois começa com "uma pisadela e um beliscão", aqui, vemos claramente a maneira irônica com a qual o autor tratará o amor ao longo de toda a narrativa. Nossa personagem principal, o chamado anti-herói, é Leonardinho, fruto da piscadela e do beliscão.
Como vocês podem imaginar, o amor entre o casal não durou muito, Maria voltou à Portugal e Leonardo abandonou o filho com o Compadre, homem misterioso que tinha verdadeira adoração pelo afilhado. Os anos passam, Leonardinho torna-se um menino e depois um rapaz muito irresponsável, mete-se em diversas confusões, mas sempre é ajudado pelo Compadre e pela Comadre, que realmente gostam dele.
Tal como o pai, nosso "malandro" também é louco por mulheres. Ele apaixona-se por Luisinha, menina recatada e até mesmo sem atrativos, mas esta foi a primeira figura feminina com a qual Leonardinho teve contato, por isso, o amor. Algum tempo depois, o garoto conhece Vidinha, mulata linda e sensual, que o deixa completamente inebriado fazendo-o esquecer-se da outra, deixando a Comadre enlouquecida, pois esta quer casá-lo com Luisinha.
Após muitas confusões, prisões e intrigas, nosso "herói" torna-se um sargento de milícias digno, casa-se com Luisinha e tudo fica muito bem.
Neste livro temos a figura do malandro, ou do anti-herói, personagem principal que não se encaixa aos moldes românticos, tal como Leonardinho, o garoto é preguiçoso, de caráter duvidoso, sempre tenta conseguir tudo da forma mais fácil, destoando do estoicismo da prosa romântica, que seguindo as teses de Aristóteles, acreditava que apenas o trágico, o sofrido é que possuía algo bom, complexo, engrandecedor. Hoje, não temos mais essas concepções, o anti-herói não mais existe, o que temos são personagens rasas e planas, profundas e redondas, mas até o século passado, o malandro de Almeida era muito estudado.
Logo, percebemos que Memórias de um Sargento de Milícias está no limiar entre o romantismo da prosa urbana - estória leve, final feliz, personagens tipos - e o realismo - visão crítica da vida, humor ácido, personagens e situações caricaturais, sendo complexa e ao mesmo tempo divertida.
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